terça-feira, 6 de março de 2018

O atraso dos pagamentos pela Administração e a manutenção da execução do contrato por até 90 dias. O que fazer? [parte 3]


A ideia dessa série de textos surgiu da constatação de que muitos empreendedores que contratam com a Administração Pública sofrem com o constante atraso de pagamentos e isso tem se agravado nesse período de crise econômica. Pior ainda é a difundida ideia de que os contratados nada podem fazer antes dos 90 dias de atraso do ente público, com fulcro na interpretação errônea do inciso XV do art. 78 da Lei nº 8.666/93.

No primeiro texto, recomendamos uma atuação mais cautelosa, fazendo uma análise de risco quanto à contratação com a entidade pública e considerando-se a possibilidade de atrasos de até 90 dias, mesmo não concordando com a interpretação de que não seria possível suspender os serviços ou fornecimento antes disso a fim de evitar maiores prejuízos. Portanto, sugerimos ao empreendedor que adote como análise de risco o pior cenário possível.

Para tanto, recomendou-se que não se assumam contratos públicos que comprometam grande parte da operação da empresa, de forma a viabilizar um fluxo financeiro sustentável por meio de outros contratos em caso de inadimplemento da Administração Pública.

Ademais, em especial em contratos em que haja cessão de mão de obra, a empresa deve se precaver mantendo um caixa para cobrir as despesas com pessoal pelo período de aproximadamente 90 dias, tempo que a lei exige para a rescisão contratual.

Já no segundo texto encaramos a realidade daqueles que já celebraram o contrato e estão passando pela inadimplência do ente público. Na ocasião defendemos que se tem feito uma interpretação equivocada no inciso XV do art. 78 da Lei nº 8.666/93. Isso porque ele não impõe ao contratado que mantenha a execução do serviço ou fornecimento em caso do não pagamento, muito menos pelo longo período de 90 dias. Logo, defendeu-se a tese de que o empreendedor poderá suspender o serviço ou fornecimento assim que verificado o atraso da Administração. Para tanto, recomenda-se a notificação formal do ente no sentido de que a falta da regularização em "X" dias acarretará na suspensão do contrato.

Ocorre que tal medida ainda não tem pacífica adoção. Em vista disso, pode ser necessária a utilização de medida cautelar em âmbito judicial. Além da utilização da tese anteriormente defendida, na ação deverá ser reivindicado o pagamento das parcelas em atraso. Todavia, mero pedido nesse sentido pode ser um tiro pela culatra, já que a Administração poderá se utilizar do pagamento via precatório o que, como regra, não é bom negócio.

Sendo assim, já é tese bastante difundida na doutrina o pedido fundado em obrigação de fazer, mais especificamente, exigindo-se da Administração Pública que os pagamentos respeitem a ordem cronológica prevista no art. 5º da Lei nº 8.666/93:

Art. 5º Todos os valores, preços e custos utilizados nas licitações terão como expressão monetária a moeda corrente nacional, ressalvado o disposto no art. 42 desta Lei, devendo cada unidade da Administração, no pagamento das obrigações relativas ao fornecimento de bens, locações, realização de obras e prestação de serviços, obedecer, para cada fonte diferenciada de recursos, a estrita ordem cronológica das datas de suas exigibilidades, salvo quando presentes relevantes razões de interesse público e mediante prévia justificativa da autoridade competente, devidamente publicada. 
Portanto, não se tratando de ação de execução contra Fazenda, não recairá no perigo de ter saldada a dívida por meio de precatórios. Em verdade, a Administração contratante será instada a proceder pagamentos obedecendo a ordem cronológica, sob pena de responsabilidade administrativa e penal do gestor público. Isso inibe que a Administração beneficie certos credores que podem possuir algum "apadrinhamento". Logo, em momento breve a Administração deverá proceder ao pagamento das parcelas em atraso sob pena de inviabilizar a própria atividade pública, pois não poderá fazer qualquer pagamento nos demais contratos que tenham sido inscritos em orçamento em data posterior.

Caso os atrasos superem os 90 dias, aí, conforme prescrito na lei, poderá ser reivindicada a rescisão contratual. Da mesma forma, aqui, sugere-se o pedido dos pagamentos respeitando a ordem cronológica para evitar os precatórios.

Interessante também mencionar solução prevista na Lei Complementar nº 123/06 para microempresas e empresas de pequeno porte em caso de atraso de pagamentos. A lei, em seu art. 46, prevê a possibilidade de emissão de cédula de crédito microempresarial quando o atraso superar 30 dias, contados da data de liquidação.

Originalmente, tal artigo fazia-se acompanhar de parágrafo único em que equiparava o referido instituto à cédula de crédito comercial, tendo como lastro o empenho do poder público, e que sua utilização dependeria de regulamentação do Poder Executivo em até 180 dias. A regulamentação nunca ocorreu e o parágrafo único foi revogado pela LC nº 147/2014.

Diante disso, forçoso reconhecer que a disposição legal passa a ser aplicável. No entanto, ainda não há nem na doutrina ou no judiciário enfrentamento da questão. Cabe, a nosso ver, que os microempresários busquem, quando conveniente, a utilização da cédula a ser emitida pelo Administração inadimplente por 30 dias. Antes, também, verificar quais instituições financeiras poderiam negociar tal título de crédito executivo. Uma das possíveis formas de utilização seria por meio do endosso do título a uma instituição financeira que pagaria o valor nominal do título ao empresário com algum desconto pela prestação do serviço de crédito. Posteriormente a instituição financeira poderia negociar novamente o título o fazer a cobrança da Administração emissora.

No entanto, a análise desse instituto disponibilizado pelo Estatuto da Pequena Empresa necessita um maior aprofundamento e merece um texto próprio para tal fim. Logo, deixamos a discussão para amadurecimento e nova abordagem em breve. 
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quinta-feira, 31 de agosto de 2017

Do Plano Especial de Recuperação Judicial para Microempresas e Empresas de Pequeno Porte (Parte 2): É um bom negócio?


No primeiro texto, traçamos um panorama geral sobre a recuperação judicial para microempresas e empresas de pequeno porte e do plano especial destinado a elas. Mas então, falta avaliar se é um bom negócio ou não adotar tal plano especial.

Bom, como era de se esperar, a lei pretende conceder algumas facilitações e reduções de encargos para as empresas enquadradas no regime jurídico das pequenas empresas. No entanto, no intento de simplificar procedimentos o legislador, muitas vezes, acabou por limitar as formas de implemento do plano de recuperação judicial dessas empresas.

Como afirmado, o legislador, determinou, por exemplo, que o juiz fixará a remuneração do administrador judicial de forma reduzida quando tratar-se de ME ou EPP, conforme art. 24, § 5º:


Art. 24. O juiz fixará o valor e a forma de pagamento da remuneração do administrador judicial, observados a capacidade de pagamento do devedor, o grau de complexidade do trabalho e os valores praticados no mercado para o desempenho de atividades semelhantes.§ 1º Em qualquer hipótese, o total pago ao administrador judicial não excederá 5% (cinco por cento) do valor devido aos credores submetidos à recuperação judicial ou do valor de venda dos bens na falência.§ 2º Será reservado 40% (quarenta por cento) do montante devido ao administrador judicial para pagamento após atendimento do previsto nos arts. 154 e 155 desta Lei.(...)§ 5º A remuneração do administrador judicial fica reduzida ao limite de 2% (dois por cento), no caso de microempresas e empresas de pequeno porte.

No que se refere à interposição da petição inicial com o pedido de recuperação judicial, já referimos que quando da apresentação da contabilidade, para EPP e ME essa poderá ser simplificada, na forma da legislação específica (art. 51, §2º).

Em relação às dívidas perante Fazendas Públicas e INSS, além do parcelamento, deferido a empresas de todos os portes, a lei garante às ME e EPP, prazos 20% superiores aos regularmente concedidos às demais empresas. É o que está disposto no parágrafo único do art. 68:


Art. 68. As Fazendas Públicas e o Instituto Nacional do Seguro Social – INSS poderão deferir, nos termos da legislação específica, parcelamento de seus créditos, em sede de recuperação judicial, de acordo com os parâmetros estabelecidos na Lei no 5.172, de 25 de outubro de 1966 - Código Tributário Nacional.Parágrafo único.  As microempresas e empresas de pequeno porte farão jus a prazos 20% (vinte por cento) superiores àqueles regularmente concedidos às demais empresas. 
Outra vantagem que se pode visualizar na adoção do plano especial é de que a assembleia-geral de credores não será convocada para análise do plano. Esse será deferido diretamente pelo juiz ao serem atendidos os requisitos legais. A despeito disso, como frisamos anteriormente, caso os credores titulares de mais da metade de qualquer uma das classes de créditos venham a juízo se opor ao plano, o juiz deverá julgar improcedente o pedido de recuperação judicial, sendo decretada a falência (!), segundo prescrito no parágrafo único do art. 72.

Aqui, acredito que a a interpretação mais adequada às finalidades da lei seria antes de decretar a falência de imediato, deveria convocar assembleia para haver chance de proceder alterações no plano, conforme disposto no § 3º, art. 56. Não havendo uma resolução, aí sim se decretaria a falência.

Ao dispor especificamente sobre o plano especial de recuperação judicial, a lei, em seu art. 71, limita seu conteúdo à possibilidade de parcelamento em até 36 (trinta e seis) parcelas mensais, reajustadas pela Selic (II); pagamento da primeira parcela no prazo máximo de 180 (cento e oitenta) dias, contado da distribuição do pedido de recuperação judicia (III) e; estabelecerá a necessidade de autorização do juiz, após ouvido o administrador judicial e o Comitê de Credores, para o devedor aumentar despesas ou contratar empregados (IV).

Critica-se tal limitação, pois a lei concede ao plano de recuperação ordinário uma gama maior de alternativas para as empresas que adotam tal procedimento, conforme os 16 incisos do art. 50. Nesse dispositivo, autoriza-se por exemplo a redução de salários (VIII), dação em pagamento ou novação de dívidas (IX) e venda de bens (XI).

Todavia, ao meu ver, ao contrário do que muitas vezes defendido, não há violação ao tratamento diferenciado às microempresas e empresas de pequeno porte. A lei, ao permitir um plano de recuperação especial, tem intuito claro na simplificação e celeridade do processo de recuperação. Ademais, as ME e EPP podem livremente optar pelo plano ordinário se assim entenderem conveniente.

Por fim, como última vantagem a ser apontada na adoção do plano especial, e que foi prevista timidamente no parágrafo único do art. 71 (muitos que escrevem sobre o tema passam ao largo da previsão), é a não suspensão da prescrição em favor do devedor, de forma contrária ao que ocorre no art. 6º, transcrito a seguir:

Art. 6º A decretação da falência ou o deferimento do processamento da recuperação judicial suspende o curso da prescrição e de todas as ações e execuções em face do devedor, inclusive aquelas dos credores particulares do sócio solidário.(...)Art. 71 Omissis (...)Parágrafo único. O pedido de recuperação judicial com base em plano especial não acarreta a suspensão do curso da prescrição nem das ações e execuções por créditos não abrangidos pelo plano.

Fica fácil notar que a ME ou EPP pode se beneficiar da morosidade do processo de recuperação judicial, ao se cogitar a prescrição da exigibilidade dos créditos que ela é devedora nesse interim.

De outro lado, a suspensão de ações e execuções só ocorreram para aquelas que estiverem previstas no plano especial. No plano ordinário, como afirmado anteriormente haverá a suspensão de ações e execuções independentemente de constar no plano e serão deferidas pelo juízo já no deferimento da recuperação.

Diante do exposto, percebe-se que o plano especial pretende conceder um procedimento mais simples e célere de recuperação judicial às pequenas empresas. De outro lado, até para concretizar tal finalidade, limita as alternativas que podem ser utilizadas nesse plano.
Caberá aos gestores da empresa fazerem a análise da conveniência em se adotar ou não o plano especial, levando em conta a equação simplicidade x maior liberdade na atuação.
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terça-feira, 29 de agosto de 2017

Do Plano Especial de Recuperação Judicial para Microempresas e Empresas de Pequeno Porte




A Lei Complementar nº 123/01 estruturou toda uma cadeia de benefícios e tratamento diferenciado para pequenas empresas em âmbito financeiro, fiscal, burocrático e de acesso aos mercados públicos. No entanto, o tratamento diferenciado a essas empresas não se restringe ao texto desta lei complementar. Há normas que tratam do assunto espalhadas por todo o sistema jurídico pátrio.

Aqui, pretendemos dar enfoque ao tratamento diferenciado conferido a essas empresas na Lei nº 11.101/05 que regula a recuperação judicial, extrajudicial e falência da sociedade empresária.

Nessa lei, a diferenciação concedida às empresas que se enquadram nos moldes da LC 123/01, tem maior relevo especificamente no procedimento da recuperação judicial.

Pois bem, em parcas linhas, podemos definir que a recuperação judicial tem por objetivo a manutenção da empresa em crise no mercado, por meio de plano de ações apresentado em juízo, no qual se enumeram os credores da empresa e a forma em que serão saldadas as dívidas.

Pode-se dizer que há a recuperação judicial com plano ordinário de recuperação e a recuperação judicial com plano especial, do qual podem optar as empresas abrangidas pelo regime jurídico das microempresas e empresas de pequeno porte.


A microempresa ou empresa de pequeno porte que optar pelo plano especial, o que será feito de forma expressa na petição inicial, deverá se submeter aos regramentos específicos previstos entre os arts. 70 e 72 da Lei nº 11.101/05. Claro é, no entanto, que naquilo em que for omisso, será aplicável o mesmo procedimento adotado ordinariamente nas demais recuperações judiciais (que não serão objeto de análise aqui).

Feita essa observação, impende destacar que poderão requerer a recuperação judicial – tanto no plano especial quanto no ordinário – as empresas que atendam aos requisitos do art. 48, quais sejam:

- estar exercendo atividade regularmente há pelo menos 2 anos;
- não ser falido e, se foi, ter responsabilidades declaradas extintas por sentença transitada em julgado;
- não ter obtido concessão de recuperação judicial, pelo plano ordinário ou especial, há menos de 5 anos;
- não ter sido condenado ou ter como administrador ou sócio controlador pessoa condenada por quaisquer dos crimes previsto nessa lei.

Atendidos esses requisitos, a empresa optante pelo plano especial elaborará a petição inicial conforme o disposto no art. 51 e incisos da lei, sendo instruída com o relato sobre a situação patrimonial e as razões da crise econômica (I); demonstrações contábeis (II); relação de credores e empregados (III, IV); certidões e documentos constitutivos da empresa (V, VIII); relação dos bens particulares dos sócios e administradores da empresa (VI); comprovantes de contas bancárias e outros investimentos (VII) e; relação de ações judiciais em que figure como parte (IX).

Especificamente acerca das demonstrações contábeis, a sistemática normativa autoriza aos pequenos empreendedores a possuírem contabilidade simplificada[1], o que é contemplado de forma expressa no § 2º do art. 51:

§ 2º Com relação à exigência prevista no inciso II do caput deste artigo, as microempresas e empresas de pequeno porte poderão apresentar livros e escrituração contábil simplificados nos termos da legislação específica.

Estando a documentação adequada o juiz deferirá o processamento da recuperação e, nos moldes do art. 52, no mesmo ato nomeará administrador judicial (I); determinará dispensa da apresentação de certidões negativas para que a empresa exerça suas atividades, exceto quando contratar com o Poder Público (II); determinará ao devedor a apresentação de contas demonstrativas mensais enquanto perdurar a recuperação judicial (IV); ordenará a intimação do Ministério Público e a comunicação por carta às Fazendas Públicas Federal e de todos os Estados e Municípios em que o devedor tiver estabelecimento (V).

Quanto ao inciso III, necessário fazer ressalva, visto que o juiz, no caso da adoção do plano especial não poderá, de pronto, ordenar a suspensão de todas ações ou execuções contra o devedor (nomenclatura legal destinada à empresa recuperanda). Isso porque, o parágrafo único do art. 71 determina que a suspensão se dará somente em relação às ações e execuções por créditos abrangidos pelo plano. Logo, o juiz, estando apenas em posse da petição inicial tem impossibilidade fática de praticar tal ato. Será necessário aguardar a apresentação do plano, para após ordenar a suspensão das execuções e demais ações.

Pois bem, deferida a recuperação, o plano especial deverá ser apresentado no prazo de 60 dias contados da publicação da decisão pelo deferimento limitando-se às seguintes condições:

- O plano abrangerá todos os créditos existentes na data do pedido, ainda que não vencidos, excetuados os decorrentes de repasse de recursos oficiais, os fiscais e os previstos nos §§ 3º e 4º do art. 49. Sobre esse ponto, bem sumariza a autora Camila Barboza Yamada:

Tanto no caso da recuperação baseada em plano comum quanto em plano especial, não podem ser objeto do plano, por força do disposto no artigo 49, parágrafos 3º e 4º, os créditos decorrentes de alienação fiduciária em garantia, leasing, promessa de compra e venda de imóvel com cláusula de irrevogabilidade ou irretratabilidade, contrato de venda com reserva de domínio e contrato de adiantamento de câmbio para exportação.[2]

- O plano preverá parcelamento em até 36 (trinta e seis) parcelas mensais, iguais e sucessivas, acrescidas de juros equivalentes à taxa Sistema Especial de Liquidação e de Custódia - SELIC, podendo conter ainda a proposta de abatimento do valor das dívidas;
- Preverá o pagamento da 1ª (primeira) parcela no prazo máximo de 180 (cento e oitenta) dias, contado da distribuição do pedido de recuperação judicial;
- Estabelecerá a necessidade de autorização do juiz, após ouvido o administrador judicial e o Comitê de Credores, para o devedor aumentar despesas ou contratar empregados.

Devidamente apresentado o plano especial, segundo o art. 72, não será convocada assembléia-geral de credores para deliberar sobre o plano. O juiz deferirá a recuperação se atendidos os requisitos legais.

Todavia, em que pese não haver necessidade de aprovação do plano por assembleia, caso credores titulares de mais da metade de qualquer uma das classes de créditos previstos no art. 41[3]-[4], utilizando-se da prerrogativa prevista no art. 55[5], se oponham ao plano, deverá o juiz julgar improcedente o pedido de recuperação judicial, na forma do parágrafo único do art. 72.

Após isso, como regra, a recuperação judicial com base em plano especial não terá procedimento diferente daquela baseada em plano ordinário.

Mas afinal de contas, a adoção do plano especial é um bom negócio? Para responder a tal pergunta necessário fazer uma análise comparativa entre o procedimento de recuperação em cada plano.

É o que será feito no próximo texto. (Leia aqui a continuação)



[1] Assim dispõe o art. 27 da LC 123/06:
Art. 27.  As microempresas e empresas de pequeno porte optantes pelo Simples Nacional poderão, opcionalmente, adotar contabilidade simplificada para os registros e controles das operações realizadas, conforme regulamentação do Comitê Gestor.
[2] YAMADA, Camila Barboza. Recuperação judicial com base em plano especial para as microempresas e empresas de pequeno porte: alterações promovidas pela Lei Complementar 147/2014Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 20n. 43887 jul.2015. Disponível em: <https://jus.com.br/artigos/40656>. Acesso em: 9 ago. 2017.
[3] Art. 41. A assembléia-geral será composta pelas seguintes classes de credores:
I – titulares de créditos derivados da legislação do trabalho ou decorrentes de acidentes de trabalho;
II – titulares de créditos com garantia real;
III – titulares de créditos quirografários, com privilégio especial, com privilégio geral ou subordinados.
IV - titulares de créditos enquadrados como microempresa ou empresa de pequeno porte. 
[4] Em que pese o parágrafo único do art. 72 remeter ao art. 83, o faz equivocadamente. Deveria remeter ao art. 41. Nesse sentido, lição de Fábio Ulhoa Coelho:
“A remissão correta, no parágrafo único, é ao art. 41 e não ao art. 83, como constou em evidente lapso. Não tem sentido adotar-se a classificação dos credores na falência no âmbito da recuperação judicial, que possui critérios próprios para classificar os credores.” (COELHO, Fábio Ulhoa. Comentários à lei de falências e de recuperação de empreas. 11. Ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2016, p. 273.)
[5] Art. 55. Qualquer credor poderá manifestar ao juiz sua objeção ao plano de recuperação judicial no prazo de 30 (trinta) dias contado da publicação da relação de credores de que trata o § 2o do art. 7o desta Lei.
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quarta-feira, 23 de agosto de 2017

A contratação de empresa remanescente no regime jurídico da LC 123/06: Deve a remanescente aceitar as condições da primeira colocada da Licitação?


Como bem se sabe, a Lei Complementar nº 123 concedeu a microempresas e empresas de pequeno porte uma série de benefícios, fiscais, de desburocratização, de facilidade no acesso às aquisições públicas, entre outros.

Entre as facilitações de acesso ao mercado público, para efeitos de participação no certame, a empresa beneficiária da LC nº 123 poderá apresentar a documentação de regularidade fiscal e trabalhista ainda que apresente alguma restrição, conforme art. 43 da referida norma. Isso porque, tais documentos são apenas exigíveis das microempresas e empresas de pequeno porte para fins de efetiva contratação.

Até aqui, nenhuma grande novidade para quem tem alguma afinidade na matéria. A coisa fica um pouco mais complicada ao nos depararmos com a redação do § 2º do art. 43 do Estatuto das Pequenas Empresas:


Art. 43.  As microempresas e as empresas de pequeno porte, por ocasião da participação em certames licitatórios, deverão apresentar toda a documentação exigida para efeito de comprovação de regularidade fiscal e trabalhista, mesmo que esta apresente alguma restrição.
§ 1º Havendo alguma restrição na comprovação da regularidade fiscal e trabalhista, será assegurado o prazo de cinco dias úteis, cujo termo inicial corresponderá ao momento em que o proponente for declarado vencedor do certame, prorrogável por igual período, a critério da administração pública, para regularização da documentação, para pagamento ou parcelamento do débito e para emissão de eventuais certidões negativas ou positivas com efeito de certidão negativa.
§ 2º A não-regularização da documentação, no prazo previsto no § 1º deste artigo, implicará decadência do direito à contratação, sem prejuízo das sanções previstas no art. 81 da Lei no 8.666, de 21 de junho de 1993, sendo facultado à Administração convocar os licitantes remanescentes, na ordem de classificação, para a assinatura do contrato, ou revogar a licitação.


Observe que havendo alguma restrição na documentação de regularidade fiscal ou trabalhista, a Administração concederá prazo para que a empresa beneficiária da LC 123 regularize a fim de formalizar a contratação. Em isso não ocorrendo, decairá o direito à contratação, sendo facultado convocar licitantes remanescentes na ordem de classificação para assinar o contrato.

A dúvida que surge nessa hipótese, visto que a lei, supostamente, não esclarece, é se as empresas convocadas deverão aceitar as condições e valores da primeira colocada ou poderão assinar o contrato conforme sua própria proposta.

Para Diógenes Gasparini, por exemplo, não se admitiria a aplicação do § 2º do art. 64 da Lei nº 8.666/93, determinando que os demais convocados assinem o contrato mediante a aceitação da proposta inicialmente declarada como vencedora. Nas palavras do autor:


Não nos parece adequado aplicar a regra do art. 64, §2º, da Lei federal das Licitações e Contratos da Administração Pública, ou seja, a convocada deverá ser contratada pelo valor da proposta da primeira classificada, dando que diversas são as situações. (...) Para a aplicação a está hipótese do art. 64, §2º, a Lei Complementar federal n. 123/2006 deveria ser expressa, o que, como vimos, não o é. Portanto, a solução está na contratação da licitante convocada pelo valor de sua proposta se esta for, pelos critérios admitidos no edital, aceitável pela Administração Pública.[1]

Discordamos nesse ponto do autor, pois é justamente o dispositivo que oferece a solução interpretativa para o § 2º do art. 43 da LC 123.

Como se sabe, é necessário que a interpretação leve em consideração o sistema jurídico em que a norma analisada se insere. Na situação em comento, o art. 43 da LC 123 se insere no sistema jurídico das contratações públicas, em que pese a referida lei tratar de forma mais ampla o tema das ME, EPP e MEI.

Portanto, a boa técnica exige que a interpretação e aplicação da lei, quando essa não for totalmente clara, recorra a normas de aplicação subsidiária, no caso a Lei Geral de Licitações e Contratos Administrativo.

Ademais, temos que partir do pressuposto que o legislador não se utiliza de terminologias em vão, sem um fim específico. Logo, quando o legislador optou por dizer que seriam convocadas as licitantes remanescentes, a nosso ver, há aí um propósito muito claro.

Tal definição na Lei nº 8.666/93 é utilizada em duas oportunidades bem características, no já referido art. 64, § 2º, e no art. 24, inc. XI.

Vale transcrever os referidos:

Art. 24. É dispensável a licitação:

(...)
XI - na contratação de remanescente de obra, serviço ou fornecimento, em conseqüência de rescisão contratual, desde que atendida a ordem de classificação da licitação anterior e aceitas as mesmas condições oferecidas pelo licitante vencedor, inclusive quanto ao preço, devidamente corrigido;
(...)
Art. 64.  A Administração convocará regularmente o interessado para assinar o termo de contrato, aceitar ou retirar o instrumento equivalente, dentro do prazo e condições estabelecidos, sob pena de decair o direito à contratação, sem prejuízo das sanções previstas no art. 81 desta Lei.
(...)
§ 2º É facultado à Administração, quando o convocado não assinar o termo de contrato ou não aceitar ou retirar o instrumento equivalente no prazo e condições estabelecidos, convocar os licitantes remanescentes, na ordem de classificação, para fazê-lo em igual prazo e nas mesmas condições propostas pelo primeiro classificado, inclusive quanto aos preços atualizados de conformidade com o ato convocatório, ou revogar a licitação independentemente da cominação prevista no art. 81 desta Lei.

Observe que nas duas vezes em que a lei se utiliza do termo remanescente, indica que esse deverá assumir as mesmas condições e preços propostos pelo licitante vencedor. 

Inclusive, ao ler o § 2º do art. 64, percebe-se facilmente que o dispositivo da LC nº 123 é verdadeira importação da Lei Geral de Licitações, pois ambas tratam da contratação do remanescente em caso de não assinatura do contrato pelo vencedor do certame.

Para nós resta muito claro, com isso, que na hipótese do § 2º do art. 43 da LC 123, o convocado remanescente deverá aceitar as condições propostas pelo licitante vencedor para ter direito a assinar o contrato com a Administração Pública.




[1] GASPARINI, Diogenes. Direito Administrativo. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 646.

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